Casa de alpendre

Casas de alvenaria, imitando as dos patrões. Uma cisterna caiada guardando águas das últimas chuvas. Ao fundo ou ao lado da nova morada, a velha ainda persiste, casebre de pau-a-pique, feita de madeira da caatinga, com colunas e vigas de carnaubeira, serve de depósito de coisas velhas e das memórias de dias difíceis.

São construções feitas com a poupança do suor de uma vida inteira, o terreno foi doado pelo tempo, os tijolos comprados aos milheiros, mês a mês, com as economias da pensão ou da aposentadoria.

Um filho, um neto, um tio ou outro qualquer parente, barateou a diária dos serviços e, em mutirão, o resto dos familiares construíram o bem mais desejado: uma casa de alpendre. A maioria não tem acabamento, isso requer mais tempo e dinheiro, mas na frente da casa e pelo menos numa lateral, há uma varanda típica da Casa Grande, a casa do coronel, do senhor dono das terras.

Era neste alpendre, que nas épocas passadas os coronéis exibiam seu poderio, ficavam sentados em suas cadeiras de balanço observando a rotina da fazenda e, mandando e desmandando seus comandados. Mas era também no alpendre que se conversava sobre as coisas da cidade, da política, da vizinhança, se contava causos e anedotas. Nesta área de convivência cantadores exibiam suas habilidades poéticas, também se tomava café, cachaça e licor.

Quando tudo estava mais calmo, na parte lateral se armavam redes e puxava à sesta. No alpendre dessas novas casas não tem tanta fartura, poder e repouso.

Uma parte é ocupada para o trabalho artesanal, na ausência de cadeiras de balanços, temos bancos, banquetas. A conversa é acompanhada de um café preto, feito na hora e de sabor brejeiro. Fala-se dos vivos e dos mortos, é uma fofoca rústica, tem ódio nas palavras, uma saudade doida, um lamento. Um fulano que morreu, outro que partiu, de quem fez o malfeito, outro que ficou “abestaiado”, uma sicraninha que se casou e outra que se perdeu.

Tanta conversa chega a uma conclusão preciosa: o ser humano é bicho que ninguém conhece, nem a medicina. Ao final da recepção: um adeus, uma boa viagem e que Deus lhe acompanhe e todos dizem: Amém!

Doutor em História pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2009). Tem experiência, com ênfase em História Local e Social, e atua principalmente nos seguintes temas: prática de ensino, oralidades, teoria pedagógica, teatro e poesia.

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4 respostas

  1. Fiquei perdida na imaginacao. Lembro de ferias, passadas do sertao, onde avos nos mimavam e nem precisavam contar historias, a vida deles ja enchia a gente de curiosidade.

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